essimela

Na sexta chegou pelo correio mais um fim (ou não fosse 2016 este ano do cão) e, eventualmente um novo recomeço, desse falarei noutro dia. Por agora tenho-me concentrado no fim. Lamentei-o. Lembrei-me do pequeno José de que vos falei em 2007 e depois da alegria da chegada do “meu” José, relembrei-me que ao longo destes anos, já lá vão 9, a foto e a carta que recebi dele foram dos meus melhores presentes de Natal. Fiquei a saber na sexta que não será assim este ano. O menino agora com 15 anos está fora do programa, não aparece na escola há algum tempo e pensa-se que terá participado num ritual de iniciação para a vida adulta e eventualmente iniciado a sua própria família. Confesso que estou triste, o meu primeiro sentimento foi de fracasso, mas passadas estas horas vejo que não. Ao longo destes 9 anos tentei dentro da medida do possível proporcionar-lhe uma melhor infância e a possibilidade de um futuro melhor. Estou certa de que fora do programa de apadrinhamento à distância a sua vida teria sido bem mais dura. Sem este programa, talvez não tivesse frequentado a escola, talvez não soubesse ler nem escrever, talvez a fome ou a doença tivessem sido ainda mais cruéis… não é um fracasso, é o tempo que passa e a vida que segue o seu rumo. Desejo-lhe hoje, sem a menor possibilidade de voltar a saber dele, ou ele de mim, enquanto as lágrimas me caiem pela cara, que seja muito, muito feliz, que esteja bem, que fique velhinho. Em 2007 quando o apadrinhei a esperança média de vida em Moçambique era de 38 anos. Em 2011, foi revisto o número para os 50.

A ti, ESSIMELA (hoje trato-te pelo teu nome), desejo-te que chegues pelo menos aos 80, embora para mim sejas sempre o menino lindo de olhos do tamanho do mundo que me chegou pelo correio em 2007 e que eu exibia aos amigos todos os Natais. De ti guardo religiosamente as fotos e as cartas, a memória e o carinho. Boa sorte na vida meu querido. VOA!

Tomás #1

Enquanto não adormeço, vou dando uma espreitadela pela net. O desumidificador ainda está a trabalhar e vai deitando ar seco e um pouco mais quente por cima. O Tomás (o gato) sentou-se na saída do ar. Tipo jarra. Daqui a bocado ainda se avaria o desumidificador e lá me fica o gato com o cú constipado!

castanhas

Hoje foi dia de magusto. Muitas mesas cheias de doces e frutos secos, muitas castanhas assadas, muitas gargalhadas e muita correria.

Eu devia sentir-me feliz, mas não sinto, a verdade é que tudo me fere. Comi meia dúzia de castanhas e refugiei-me a um canto. Não tardou que a Adriana e a Diana aparecessem abraçadas à minha frente.

“O que é que se passa consigo? Está triste?”

Elas ainda nem tinham terminado a frase e eu já tinha as lágrimas a caírem-me cara abaixo.

“Um bocadinho, mas já passa.”

“É o quê? Está preocupada com a sua filha?” – Perguntou-me uma delas.

“Não querida, eu não tenho filha.”

“ Não tem filhos?!” – Perguntou-me a outra incrédula.

“Não. Não tenho filhos.”

“Então chateou-se com o seu marido.” – Continuou com ar de quem matou a charada e me descobriu a tristeza.

“Não amor, também não tenho marido.”

Olharam-me as duas com os olhos carregados de pena, nem filhos nem marido, que merda de vida teria sido a minha. Naturalmente foi a que eu escolhi e com franqueza não a lamento, gosto dela, mas esta experiência tem sido também ela uma terapia, que me obriga a pensar muito.

“Posso pedir-vos que não contem que eu estou assim triste? Fica um segredo só nosso está bem?”

“Está bem, mas pense noutras coisas, para se distrair.”

Prometi que sim, pensaria, pedi-lhes que fossem brincar e elas assim o fizeram. Passados uns minutos estavam de volta. Sorriso rasgado e nas mãos dois copos, um cheio de castanhas e outro para metermos as cascas.

“Quando alguém está triste devemos fazer assim, distrai-la.”

Agradeci, quase solucei e ficámos ali as três a comer castanhas. Cada vez mais acho que sou como o Pedro, o meu problema não são as crianças, eu não gosto mesmo é de pessoas!

o blogue

Este ano, eu que sou altamente controladora, perdi o controlo de tudo. Absolutamente perdida, acabei por voltar ao blogue, voltamos sempre aos sítios onde fomos felizes. Primeiro não havia por aqui ninguém, talvez uma ou duas amigas que são da casa, meia dúzia de visitas diárias por “acidente”, mas depois, sem que eu perceba muito bem como tudo mudou também por aqui. O número de visitas aumentou, muito, todos os dias, acho mesmo que há pessoas que se estão a dar ao trabalho de ler o blogue praticamente todo. Cuidado, devo avisar que as poucas pessoas que o fizeram, me tocaram de tal forma que nunca mais saíram da minha vida. Eu pareço ruim, mas com o tempo sou uma criatura adorável! 😛

Os desconhecidos ou apenas envergonhados que por ai andam (não tenho como saber quem são), digam qualquer coisa, comentem, deixem mensagem, digam o vosso nome ou inventem um, sejam vocês próprios ou quem vos apetecer, por aqui também nem sempre sou eu, às vezes sou outras(os) que gostava de ser, outras vezes sou outras(os) que me assustam, há até vezes em que sou alguns que me repugnam, mas em todos acabo por pôr um bocadinho de mim. Digam olá, bebam um copo, partilhem comigo o que vos vai na alma, prometo que vos darei o mesmo em troca. Se me dedicam tempo de leitura (e convenhamos eu não escrevo merda nenhuma de jeito), permitam-me agradecer, dizer o quanto é importante sentir que daí desse lado existe alguém com dores idênticas às minhas ou simplesmente com demasiado tempo livre em mãos.

Até já. Beijo.

Marta

o Pedro que não gosta de pessoas

Depois do recreio do almoço muitos sentam-se numa das minhas cadeiras da “enfermaria”, seja porque efectivamente se magoaram, ou porque simplesmente não lhes apetece voltar para a sala.

Hoje não foi excepção. Um dos meus “clientes” foi um miúdo pequeno, de olhos grandes e tristes, disse-me cabisbaixo que tinha magoado o joelho. Sentei-o numa das cadeiras vazias, fui buscar gelo e tentei perceber se a coisa era a sério ou se era fita. Meti conversa, nada. Nem um sorriso, nem um levantar de olhos.

“Como é que te chamas?”

“Pedro.”

“Olá Pedro, eu sou a Marta.” – Nada. – “Dói-te muito?” – Abanou a cabeça que não. – “Estás triste?” -Voltou a abanar a cabeça que não. – “Conta-me, o que se passa contigo?” – Olhou-me pelo canto do olho.

“Nada. Só não gosto é de pessoas.” – Apeteceu-me gargalhar enquanto ele continuava – “Bom, gosto dos meus pais, da minha família e dos meus amigos.”

“Posso contar-te um segredo?” – Olhou-me pela primeira vez, curioso. – “Prometes que não contas a ninguém?” – Abanou a cabeça que sim – “Eu também não!”

Conclusão da história, roubei um sorriso rasgado e uma gargalhada ao “Pedro que não gosta de pessoas”, que foi a coisa boa do meu dia e eu que achava que não gostava de crianças, afinal não gosto é de pessoas, às crianças às vezes roubam-se sorrisos e ganham-se dias…

medo do escuro

Vi há pouco na tv um miúdo que dizia ao avô ter medo de dormir sozinho, mas, quando fosse grande iria casar e dormir acompanhado, nunca mais teria medo.

O avô respondeu-lhe que talvez fosse por isso que a maioria das pessoas se casavam, porque tinham medo de dormir sozinhas.

Foi assim, que aos 40 anos, ouvi a primeira definição de casamento que me pareceu aceitável… por cinco minutos, depois lembrei-me que não há maior solidão do que estarmos acompanhados e nos sentirmos miseravelmente sozinhos…

… eu tive a vida toda medo do escuro… boa noite!

 

 

 

Gostava de ter sido eu a escrever isto #1

Detalhes [+18]

O ritmo da nossa respiração, quase que silenciosa, em compasso com o movimento dos nossos corpos buscando, ensadecidamente, um ao outro. Querendo desafiar as leis da física, ocupando o mesmo espaço entre o banco do motorista e o volante. A umidade tomando conta dos vidros, fazendo-os embaçar. E nós, muito mais do que úmidos, nos beijando com a boca e com os olhos.
Um braço meu envolvendo o banco por trás, pra ficar em você ainda mais e o outro em volta da sua cabeça, puxando devagar seu cabelo, deixando você arrepiado. Nossos rostos encaixados um no outro, seus gemidos escapando entre os dentes enquanto eu mordia seu pescoço. E suas mãos… suas mãos que já denunciavam seus pensamentos antes de me tocar, quando, a poucos centímetros de mim, faziam uma pausa pra pensar… me deixando por alguns segundos sem ar. E então seguiam, explorando todos os lugares alcançáveis e imagináveis. De um jeito que só você sabe.

Fui condescendente. A rua era deserta, mas, hora ou outra um farol fazia crescer nossas sombras no banco de trás. Só pro coração acelerar. E a gente ria, sorria, gostando de saber que ia dar pra continuar. E nem nos preocupamos em deixar nossas roupas por perto… A essa altura, já tinha seu gosto na boca, porque a gente começa assim, não é? Eu provando você…

De baixo pra cima, entre beijos e mordidas, arrepiando com os seus carinhos e te fazendo arrepiar. Deixando você bagunçar meu cabelo, e marcar minhas coxas com seus dedos, em cada aperto forte, carimbando suas digitais em mim. É que a gente se encaixa sem esforço, sem roteiro. E quando você está mim, não existe nada fora de nós. Fico submersa ali, ouvindo seus sons.

Dessa vez não teve música, mas a gente deu conta do barulho. Em algum lugar no tempo, ou no espaço, estou ali ainda. No seu colo, sentindo sua pele na minha, olhando pro vidro embaçado e respirando tão ofegante quanto você. Deixando você me abraçar e ganhando um beijo na testa, pensando, satisfeita, no quanto é delicioso fazer você sentir prazer.